foto: TootSweetCarole por Pixabay
A relação do homem com os canídeos
remonta da pré história. O cão tornou-se geneticamente distinto do lobo há
cerca de 135 mil anos, o que corresponde aproximadamente aos primeiros
vestígios do Homo sapiens no registro
fóssil. A ação antrópica através da seleção artificial gerou inúmeras variações
morfológicas, correspondentes à utilização bastante diversificada observada no
cão doméstico na atualidade.
A
maneira como cães e outros animais são vistos pelos seres humanos foi se diferenciando
à medida que sua capacidade subjetiva evoluiu e, aos poucos, foi se criando uma
nova forma de relacionamento, marcada pela maior proximidade física e vínculos
afetivos mais fortes entre as duas espécies.
O
cão vem sendo incorporado como membro da família, o que implica em maior
responsabilidade do ser humano com relação a estes, que passam a receber mais
atenção e cuidados, tanto fisiológicos quanto emocionais. Na história da
humanidade, talvez seja a época atual, devido às características o sujeito
contemporâneo, que observamos uma maior dependência significativa emocional
entre o homem e animal.
Infelizmente,
apesar da evolução deste relacionamento, muitas vezes ainda se observa uma
hierarquia antropocêntrica, herança do pensamento aristotélico de
superioridade, que dificulta a aceitação de novos conceitos, impedindo por
vezes uma relação mais satisfatória para ambos os lados envolvidos.
Diversos
estudos mostram que os benefícios da relação dos cães com humanos são
incomensuráveis, superando incontestavelmente possíveis riscos relacionados a
zoonoses frequentemente enfatizados por
pessoas que repetem sem questionar conceitos arcaicos pré-estabelecidos.
O
objetivo do presente artigo é elucidar algumas dúvidas freqüentes sobre
possíveis riscos do convívio entre cães e seres humanos em ambientes públicos
com maior enfoque sendo dado a presença dos mesmos nas praias.
A larva migrans cutânea (LMC) ou
dermatite serpiginosa, conhecida popularmente como bicho geográfico, é causada
pela forma larvar de helmintos da classe Nematoda, mais frequentemente por
espécimes do gênero Ancylostoma. As
espécies mais comuns são Ancylostoma
duodenali (que parasita cães e humanos), A. braziliense (que infecta gatos) e A. caninum (observado em cães e gatos). Apesar de normalmente apontado como único
causador de LMC em praias e praças, o cão não é o único responsável. Além do Ancylostoma, outras espécies também
podem ocasionar a LMC, como por exemplo Bunostomun sp (parasita de bovinos) e o Strongyloides stercoralis (parasita
intestinal humano, cosmopolita de alta incidência em crianças). Quando em
contato com espécies não evolutivamente adaptadas ao organismo humano, este se
torna um hospedeiro acidental. O parasita se desloca pela região subcutânea mas
não se desenvolve e nem consegue completar seu ciclo de vida.
Em cães, o Ancylostoma ocasiona anemia devido á hemorragia intestinal aguda
ou crônica. Ao penetrar na pele, a larva
causa reações cutâneas como eczema úmido e ulceração nos locais da infecção
percutânea, acometendo principalmente a região interdigital. A doença é mais
observada em cães com menos de um ano de idade. Os filhotes também podem se
infectar pela via transmamária ou transplancetária se a mãe for portadora desta
enfermidade. É uma patogenia bastante debilitante e filhotes muito novos são
mais susceptíveis devido às baixas reservas de ferro.
Apesar de grave, a doença é
facilmente tratável e pode ser evitada quando se adota o protocolo de
vermifugação periódica. Os parasitas são sensível a grande maioria das drogas
endoparasiticidas (vermífugos) disponíveis para venda em pet shops e lojas
agropecuárias. Urge ressaltar que um cão vermifugado não elimina ovos nas fezes
e que os cães infectados rapidamente apresentar-se-ão sintomáticos, sendo portanto
uma enfermidade de fácil diagnóstico e tratamento.
Uma questão geralmente pouco
abordada é a relação parasita/hospedeiro. Em sua grande maioria existe uma
especificidade nesta relação que é resultado de um longo processo evolutivo.
Como exemplo pode ser citado o carrapato vermelho comum, Rhipicephalus sanguineus,
encontrado apenas em canídeos e o Boophilus
microplus, parasita exclusivo de
bovinos. Ambos não são capazes de se
fixar e se alimentar em primatas (no caso o ser humano), mesmo que vivam no
mesmo ambiente.
De maneira análoga, temos uma ampla
gama de helmintos, fungos e protozoários que são específicos da espécie humana,
não sendo patológicos para o cão. Deste modo a probabilidade de um humano ser
infectado por outro nas vias públicas, praias e parques é infinitamente
superior que a de ser acometido por um patógeno oriundo de outra espécie. É
importante também lembrar que com a evolução da medicina veterinária já se é
possível controlar de forma eficaz problemas outrora graves, como a raiva, a
leptospirose e a leishmanionse visceral, através de vacinação preventiva.
Na sociedade atual o acesso a
serviços veterinários e a tratamentos profiláticos vem crescendo
exponencialmente. Ao se tornar parte da família existe uma maior
conscientização e preocupação com a saúde e higiene dos animais de estimação.
Um cão bem cuidado, que recebe acompanhamento veterinário, é vacinado e
desparasitado regularmente não oferece risco à saúde humana, incluindo idosos e
crianças, muito pelo contrário,
No cuidado com crianças com câncer,
a terapia assistidada com cães em hospitais tem colaborado para melhorar a
autoestima, compensar déficits afetivos e estruturais, aumentar a concentração
plasmática de endorfinas, melhorando a
qualidade de vida. Estudos revelam que a presença de cães não favorece o
aparecimento de infecções oportunistas, mesmo considerando o estado de
imunossupressão em que se encontram os pacientes.
As conclusões obtidas por
pesquisadores de diversas áreas de conhecimento corroboram com a afirmativa
principal deste manuscrito de que animais saudáveis não oferecem risco à saúde
e que a convivência de cães e pessoas traz
uma gama de benefícios sociais e terapêuticos, não havendo portanto razões para
que não acompanhem seus proprietários em seus momentos de lazer, em praias,
parques e praças.
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